domingo, março 23, 2008

MORTE É FELICIDADE IV


O QUE É A MORTE ? (Continuação)

a) para onde vou?

Pergunta de pôr os cabelos em pé a muita gente é a de saber para onde irá depois de morto. Se vai para o nada, e o nada já é alguma coisa, se vai para o inferno ou para o purgatório, os mais coerentes nunca falam do céu, se vai para o eterno descanso, e respectiva pasmaceira, ou, contrariamente, se vai trabalhar que nem um condenado.
Na impossibilidade de encontrar uma resposta que lhe preencha o vazio, o incrédulo assustadiço deixa escapar-se-lhe o sono, tão necessário para a libertação do Espírito que necessita de aprender e reencontrar por breves momentos alguma liberdade, e deita-se a meditar sobre o que julga de insólito. Aí, acompanhado pelo vazio das mais altas especulações filosóficas de trazer por casa, toma-se de angústias místicas, inventa fórmulas bizarras que nem as crianças aceitariam, e afirma-se possuído por eminente Espírito de luz.
Depois, e para completar o quadro clínico cujo diagnóstico seria neurose obsessiva, acaba por dizer que, depois de morto e bem morto, vai para onde Deus quiser. É quando dá sinais de alguma lucidez, ou pelo menos de um laivo de coerência, muito embora a pergunta permaneça: Para onde raio irei eu quando estiver bem esticado?
Lamentavelmente, a questão não é posta pela vida. Isto é, a pergunta deve ser levantada a partir do modo como é absorvida a existência presente. Como são gastas as forças que Deus nos dá, como usamos a inteligência, como ocupamos o nosso espaço mental.
Em Espiritismo a resposta é fácil e simultaneamente complexa. Depois do desencarne, iremos para o mundo da nossa consciência, o mundo do nosso merecimento, o mundo encarado como uma resultante do que construímos quando na Terra.
Iremos para um mundo relativamente leve, relativamente pesado, mas sempre para o que merecemos. Até porque esse futuro, o mais certo dos futuros, é sempre uma surpresa agradável. Há que perceber que, por mais abjecto que um homem seja, ele também é filho de Deus, tem amigos que desejam reencontrar-se com ele. Bons e menos bons, todos são igualmente esperados com muito amor no lado de lá. Ninguém está isento desse amor divino e lúcido. Todos fazem parte da mesma experiência, muito embora ela seja irrepetível, singular, intransmissível.
Em uma palavra, depois da morte iremos para um outro tempo, o das colheitas, onde iremos de certeza colher os frutos mais ou menos saborosos da árvore da nossa vivência espiritual.
Tomemos em atenção alguns aspectos sobre os quais assentam as maiores incertezas:

b) o que vai acontecer?

Este é o maior dos medos. Há quem tema perder o sentido de si mesmo, da sua individualidade, ou até deixar de ter vontade própria. Outros temem encontrar um vazio muito grande, um silêncio sepulcral, ou sentirem-se presos dentro do caixão lutando infrutiferamente para saírem. Não falta quem julgue ir encontrar um velho de barbas brancas, acusador feroz, intransigente, pronto a mandar para o inferno todos os que não fizeram a sua vontade.
As Entidades esclarecedoras dizem, porém, o seguinte. Quando deixa o corpo, o Espírito permanece como que adormecido durante um tempo indeterminado. Durante esse tempo ele não está só, mas acompanhado pelo seu Guia, que o protege e aguarda o momento do despertar, tal como a mãe aguarda o nascimento do filho cuidando da sua gravidez a fim de garantir bem estar ao bebé.
Quando desperta, a Entidade não está consciente do seu verdadeiro estado (para a esmagadora maioria das Entidades), tal como o bebé não tem consciência de que está no mundo. Esse acordar para a vida é mais ou menos lento, de um modo geral muito lento, pois a Entidade não se dá conta do mundo em que está. Se for muito ignorante, é natural que, durante um longo período, pense que está a exercer as mesmas tarefas que quando em vida na Terra. É nesta altura que a prece se torna mais incisiva, a esclarece e a faz perceber o seu verdadeiro estado.
Não tendo um pensamento fortalecido, vai onde a chamam, invocando-a, sofre a sensação de abandono quando não sente nenhuma prece, ou então frequenta os lugares mais horríveis da Terra, tais como cemitérios com corpos depositados (há cemitérios sem corpos, e esses são-lhes agradáveis). Se era um viciado, desloca-se aos lugares frequentados por pessoas que tenham os mesmos vícios: tabaco, álcool, droga, sexo, gula, jogo... Se era um místico fanático, aproxima-se dos ambientes afins: seitas, grupos de gurus, religiosos fanáticos, ideologias perigosas que põem em risco a paz e a liberdade de expressão (aspectos muito importantes entre os Espíritos). Se era um médium charlatão, frequenta casas de bruxaria, feitiçaria, e toda a espécie de negatividades a fim de provocar fenómenos, ditar máximas sem sentido, desviando os seguidores mais desatentos do verdadeiro caminho para Deus.
Quando se dá conta do seu verdadeiro estado, revolta-se, vê-se perseguida por todos quantos prejudicou, quer por pensamentos, quer por acções, quer por palavras menos dignas, sente medo; tem frio ou muito calor, enfim, as narrativas nesta área são extremamente diversificadas, pois as Entidades mais negativas experimentam sensações tão estranhas que nos são difíceis de definir.
Nesta altura, estamos no ponto ideal para doutrinar a Entidade, isto é, ou ela tem força para ouvir o seu Guia, e é este quem a doutrina, ou liga-se a alguém de carne e osso esperando que este, através da voz material, lhe dedique uma prece, esclarecendo-a. Para isso não precisa de a ver nem falar com ela, apenas que, ao orar, saiba que a sua prece é uma preciosíssima caridade para com os desencarnados. Até porque esse deve ser um dos objectivos primordiais da prece (ver Espiritismo em Portugal, O levantar do véu, pp.157-.169), e não, contrariamente ao que muitos pensam, ter uma capacidade mediúnica fenomenal. Caridade não é mediunismo. Caridade é amor.
No entanto, se a Entidade não é capaz de “sobreviver” com alguma felicidade no lado de lá, recorrendo por si mesma a estas pessoas (Guias e oradores terrenos), então, através dos encarnados a que se liga, irá ser doutrinada em trabalhos de evangelização, ou por via mediúnica manifestando-se através dos médiuns de incorporação.
Aí é-lhe dito que já não pertence à Terra, que peça perdão a Deus das suas faltas, que perdoe a todos os que a ofenderam, seguindo, caso aceite, para uma Escola espiritual onde continuará os seu aprendizado.
Se o desencarnante é uma Entidade já um pouco esclarecida, então os passos que segue não serão estes, ou sê-lo-ão de forma mais abreviada. Poderá não sentir perseguições, nem sentir-se fisicamente agredida, perseguida, nem dependente de outros qual possesso. Por vezes, a ajuda do Guia é-lhe suficiente, ou apenas a prece dos encarnados, ou algumas sessões evangélicas.
Isto significa que não há um modelo de mundo, mas uma pluralidade de mundos, sendo um deles compatível com o seu estado evolutivo. Porém, seja em que caso for, as Entidades encontram sempre muitos amigos e inimigos que conheceram ao longo das existências, alguém que sente muitas saudades e que zelou pelo seu bem estar quando na Terra.
Entretanto, já com consciência do seu verdadeiro estado, solicita não raro que lhe permitam vir visitar os familiares e amigos que deixou na Terra. Para isso, é necessária alguma preparação, pois vulgarmente experimenta grandes dissabores ou mesmo desilusões. Outras vezes encontra uma família triste com a sua perda e tenta à viva força dizer-lhes “Eu estou bem, não se aflijam. Estou melhor que vocês, pois isto cá deste lado é maravilhoso.” Lamenta que não a oiçam, não a vejam, mas sabe que alguma sensação provocou.
Isto acontece quando, sem mais nem menos, nos lembramos de alguém que já faleceu há muito tempo e que, sem mais nem menos, nos “aparece” à memória. Até porque não há ninguém a quem isto não aconteça, uma vez que todos somos visitados pelos mortos, todos temos os nossos amigos do lado de lá. Por isso é que se diz que a morte não separa ninguém.
Em suma, o que nos vai acontecer após a morte só Deus o sabe. Não há ninguém que possa dizer que vai acontecer isto ou aquilo, concretamente, tal como ninguém pode profetizar quanto ao fim do mundo. Os Guias limitam-se a dar exemplos genéricos, e nunca a descerem à particularidade de cada um. Apenas podemos ter a certeza de que iremos para o mundo construído pela nossa vivência espiritual quando na Terra, mundo esse todo justiça, todo verdade.

UMA BOA PASCOA.

Barbara Diller


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