AS LUZES DA RIBALTA
Lindas e ofuscantes, atractivas e avassaladoras, a luzes
da ribalta invadiram a cena religiosa conferindo um lugar ao sol aos seus
líderes no cenário político das sociedades do século XXI. Vão longe os tempos
da manipulação ideológica. Hoje vai-se mais longe. Já não é pelo medo do fogo
do inferno, dos pecados mortais, do castigo implacável.
Hoje fala-se de verdade, transparência, liberdade, direitos e deveres dos leigos
entupindo-os com falsas promessas. Não há melhor forma de garantir o sucesso
que introduzir no discurso uma réstia de segredo revelado, verdades que
supostamente permaneceram ocultas durante séculos, tornarem-se, perigosamente,
manipuladas e acessíveis a todas as mentes.
Por outro lado, não há religião que não queira ser
reconhecida pelos políticos, não há orador que pretenda o anonimato. Isso
significaria não ter nome na congregação, perder-se no emaranhado, embora tão
complexo quanto perigoso, dos discursos manipuladores do que poderíamos
chamar”sociologia religiosa”.
Falsamente aceitando as verdades da Ciência, outros
combatendo-as ferozmente, introduzem a juventude na resistência ao discurso
científico, impondo-se por uma fé árida e oca. Mercê de uma vida em franco retrocesso
econónico, as famílias desesperadas e o cenário de pobreza a aumentar, sem falar das questões ecológicas, as
religiões, quais empresas lucrativas, continuam, na sua maioria, a prometer o céu ou o paraíso no outro mundo,
numa irracionalidade sem tréguas.
Noções como razão, vida, morte, mundo, eternidade, etc.
são facilmente remetidas para Deus como o tubo de escape da ignorância. Assim,
os discursos bem formulados, cheios de técnica de oratória, seguida a rigor
pelos líderes religiosos, são facilmente aplaudidos pelos fiéis. Estes,
adormecidos e acríticos, pensam ter a salvação garantida, tão simplesmente
porque negaram a Ciência como um dos alicerces da nossa existência.
Não contentes com isso, se tomarmos como exemplo o
Espiritismo, criam-se denominações tais como “ciência espírita, filosofia
espírita”, como se houvesse átomos espíritas, células espíritas, gripe
espírita, automóveis espíritas.
Esses oradores são os vip das organizações religiosas, de
tal forma que, se é necessário angariar fundos para obras ou remodelações, eles
são os convidados de honra porque se sabe que, de antemão, a sala vai estar
cheia e o sucesso garantido.
Ora enquanto o
religioso não tomar o seu devido lugar, que é ajudar os fiéis no seu caminho
espiritual, facto que começa na educação, que significa, antes de tudo, escola
da tolerância, está salvaguardado o ateísmo religioso.
Se perguntarmos para que serve a religião,
responder-se-á, e muito bem, para garantir alguma coisa. Ninguém está numa
religião se esta não lhe der nada, não disser nada, não lhe conferir alguma
estabilidade naquilo que a pessoa mais precisa. Mas o que acontece é isso? Cada
um responda por si.
A religião-espectáculo está a invadir o cenário religioso
o que, numa amálgma de gente, se o orador não tiver bom-senso, pode, à rapidez
do relâmpago, criar fanáticos prontos a fazer tudo o que lhes disser.
O perigoso quanto apreciado dom de palavra do oraddor é
meio caminho andado para que este se torne um líder bem sucedido, não sem que
se tenha em conta o conteúdo do discurso. Considerado como um génio, uma voz de
Deus, um profeta ele pode dizer o que quizer.
Acredito que, um dia, ter-se-á a religião como o encontro
fraterno de todos os viventes à face da Terra, humanos e não humanos, baseado
na tolerância e onde não haverá importantes porque todos os seres trazem
consigo um manancial grandioso da centelha divina.
Unidos, acima de tudo, pelo muito amor ao próximo e ao
planeta, amá-los-ão verdadeiramente, e Deus deixará de ser algo que pensa por
nós, castigador implacável, em nome do qual grandes crimes se cometem, mas a
fonte de onde jorra a paz universal, um referencial do lado inexplicável da
vida.
A vaidade do brilho envernizado dos belos discursos dará
lugar à oração universal de louvor e glória a Deus. A fé deixará de ser um
espectáculo, ou motivo de divisão, e passará a ser caminho de humildade.
Quando as organizações religiosas deixarem de ter gente
importante e influente virar-se-ão para o humano no seu caminhar vertical, rumo
a um mundo que só Deus sabe qual é.
Por enquanto, pequenos grupos fazem uma autêntica
travessia no deserto, no anonimato, fiéis às suas convicções pacifistas e aos
desígnios de Deus. Eles existem em todas as religiões? É possível. Na
impossibilidade de as conhecer a todas, e dando voz ao optimismo da fé num Deus
salvífico e Pai, não queremos duvidar que seja verdade.
Margarida Azevedo