segunda-feira, abril 25, 2011

A MUNDIVIVÊNCIA DOS NOSSOS AFECTOS

(Continuação)
1. O amor é um sentimento enganador

“É verdade que os amantes concordam que são mais doentes de espírito do que lúcidos, e que estão cientes da falta de bom senso, da desordem do seu pensamento e da incapacidade de se dominarem.” (PLATÃO, 1981, pp. 22-23).

Aprendemos, segundo os parâmetros da fecunda, teórica e impraticável coerência dos mais velhos, ou no interesse das regras sociais, que a escolha da pessoa por quem nos apaixonamos ou com quem vamos viver deve ter em consideração determinados requisitos. Geralmente esses requisitos obedecem a regras de interesses, pois que os apaixonados desconhecem o bom senso, o que só por si justifica o facto de haver tanta gente a quem a sorte, pelo casamento, bateu à porta.

“Se fosse uma pessoa de juízo não teria tido tanta sorte”, ouve-se com frequência. Porém, sem que o saibam, as pessoas que o dizem pronunciam uma máxima grandiosa. A todos, sem excepção, é dada uma oportunidade de melhorar a sua vida, seja pela via do trabalho, seja pela do casamento, seja pela dos filhos.

Não interessa o meio, é o afecto que, manifestando-se segundo uma multiplicidade de aspectos, se impõe ao próprio indivíduo facultando-lhe os meios necessários à sua reforma interior.

Não temos outro processo. A nossa ignorância, pela voz da inveja, é a grande criadora da infelicidade própria e alheia, esquecendo-se de que todos somos filhos de Deus e todos merecemos igualmente a Sua atenção.

Porque é que o amor é um sentimento enganador? Porque se confunde amor com egoísmo. Porque o amor impede que o trabalho siga o seu ritmo normal. “Há que não misturar os sentimentos com a vida profissional,” diz-se como apelo à competência. Mais, ser competente é trabalhar sem amor, é ter a capacidade colossal de deixar o coração fora das questões laborais, criando uma realidade à parte.

Por outro lado, ser bom marido ou boa esposa significa não trazer para casa os problemas referentes ao exercício da profissão, principalmente quando estes significam dedicação e afecto. Amar a profissão, sim, mas só dentro do local de trabalho.

Dizem alguns que o amor rebaixa, quem ama age com insensatez, que a paixão ofusca o raciocínio. Parece, dizem, que o amor é um sentimento egoísta. Por exemplo, quando devemos alguma coisa a alguém, pagamos primeiro a quem não amamos é só depois a quem amamos. Há quem defenda, por isso, que o amado é um bode expiatório do egoísmo do amante, explorado e tido em menor conta, que o apaixonado, ele mesmo, não acredita no poder do amor, pois que amar é estar possuído de loucura incontrolável, de tal modo que a pessoa age frequentemente contra os seus próprios interesses.

Diz-se ainda que quem ama vive iludido, apático, é indisciplinado, deixa-se possuir por um único objectivo que é possuir o amado, aliás, faz a vida depender dessa posse. Para o amante, a razão de viver depende da felicidade que lhe possa advir do amado, e cai em infelicidade quando não é correspondido. Abandona tudo o que gosta em função do outro e deixa-se tomar pelos vícios quando não atinge o objectivo. Num quadro mais avançado, o amante suicida-se quando não consegue realizar o sonho de possuir o amado.

O amante torna-se crente ou agnóstico, “ateu” ou místico só para agradar ao amado. Muda os gostos, a personalidade. Deixa de frequentar os locais habituais, muda a aparência, cuida-se excessivamente, cultivando uma ridícula narcísica imagem do ego. Torna-se desleixado, porém, quando não consegue fazer com que o amado aprecie a sua imagem como ele deseja.

O amante mente com frequência se vir que tal lhe é importante para chegar ao amado, inventa situações, ilude, faz parecer ingénuo o indivíduo mais crítico, enegrece a boa reputação do mais honrado dos seres.

O apaixonado não tem qualquer noção do belo. Ele observa o horrível e, porque apaixonado, ama-o como uma coisa bela, a mais bela das coisas.

Também não sabe o que é o bem. Ama o mau que, cegamente, lhe parece o melhor dos bons, o melhor dos melhores. Sente-se feliz apenas porque experimenta o sentimento do amor, desconhecendo que está a cultivar o seu próprio fosso.

É em nome da ilusão amorosa que se são feitos os discursos oratórios, rezas, infindáveis pedidos a Deus e aos anjos. O amor, quando enfatizado, acarreta graves consequências para qualquer orador, bem como para a multidão que o ouve. Ele alude, pela força da insensatez, quer à passividade estúpida e adormecida, quer à agressividade. Por seu lado, na multidão, pelo excesso de admiração e zelo, todos vêem o líder como um deus, o ser melhor do mundo. A multidão sobreexcitada endeusa o líder encarando-o como a voz directa de um ser supremo.

Movido pelo sentimento do amor, o apaixonado toma decisões que põem em risco o bom funcionamento de um grupo ou colectividade, apenas porque age segundo moldes que vão contra os interesses de todos, bem como de si mesmo.

Em nosso mundo, não são poucos os exemplos de homens que se deixaram corromper nas mãos de mulheres manipuladoras, conduzindo-os à miséria, à subserviência, à escravidão.

As disputas entre famílias são oriundas do amor entre alguns dos seus membros que, temendo perder o afecto dos que amam, caluniam de modo a separar pessoas que, de outro modo, seriam muito amigas.

O amor torna perigosa a pessoa apaixonada, pois, qualquer pessoa, por mais pacífica, é capaz de se tornar violenta e agressiva, por vezes homicida.

O amor tem sentido na medida em que há ciúme, sentimento que prova a sua real existência. Quem ama quer o amado só para si, com todas as suas atenções, todos os seus mimos, todos os seus carinhos.

O amor age na insegurança, na desconfiança, não conhece quaisquer barreiras à sua concretização. O amor não olha a meios para atingir os seus fins, uma vez que tudo lhe serve para conseguir seus intentos.

Por todas estas razões e mais algumas, o amor tem sido a desgraça da humanidade que se vê perdida entre guerras, destruição em massa, violações, desrespeito pelos direitos próprios e alheios, confusão entre o que pode e o que deve ser feito.

O amor é a voz da insensatez, da desordem, rosto da malvadez e de tudo o que de mais ignóbil a humanidade tem produzido.

2. “O amor é um deus”

“(…)mas acontece que muitos dos nossos bens nascem da loucura inspirada pelos deuses.”(ibid., p.61).

É impossível confundir o egoísmo, ou qualquer sentimento enganador, com amor. Não é possível confundir um turbilhão de sentimentos loucos e desarrumados, perdidos na indefinição, com o sentimento mais livre e sincero. Não é possível ter a prisão como um lugar de liberdade, as trevas como luz, a mentira como verdade, o ódio como amor.

Na desordem espiritual em que se encontra, a humanidade não compreende que amar só depende de si, como acto de boa vontade, de abnegação, exigindo que cada um vá, por vezes, contra si próprio.

Mas isso não significa colisão com a ordem estabelecida. Pelo contrário, é impor à ordem a aparente das coisas, ou seja, a desordem, a ordem verdadeira do Espírito. Também não significa interesses opostos entre o singular e o particular. O eu e o todo só fazem sentido na convergência de interesses que são sempre comuns, partilhados.

Não podemos considerar amor tudo o que é pertença do mais puro egoísmo.

É o egoísmo que nos faz chamar amor ao jogo de interesses, manipulações, tráfico de influências, comportamentos, com aparência de positivos mas por dentro desfasados e mesquinhos.

É o egoísmo que, na sua forma mais comum de apresentação, o orgulho, faz as afeições mais puras parecerem um mal.

O amor tem a noção exacta da justa medida, da justiça e do bem. Tudo isso ele deseja porque sabe que a sua concretização depende da boa conduta.

O amor depende inteiramente da fé. É paciente, sabe esperar, sabe compreender, sabe lutar, sabe existir.

O amor não tem inimigos porque sabe que nem o ódio, nem o rancor, nem a humilhação fazem parte da sua existência, do seu mundo.

O amor não tem absurdos. Tudo lhe é lícito porque tudo o que é seu é bom, é fácil, é suave, é belo.

Pelo amor somos companheiros de um caminho longo que, de pesado, se torna leve; curvamos o inimigo ao bem e destruimos-lhe a sede de vingança.

O amor não altera o ego, pois ele é o verdadeiro estado, o real estado de todo o vivente.

O amor não se reduz à posse.

O amor não é um fosso, um mal, uma fonte de desentendimentos.

É o amor que nos traz a noção de imortalidade, do que permanece. Pelo amor somos contemplativos, estamos despertos para o que é verdadeiramente real.

O amante possui coragem e discernimento, quer da justiça quer da paz. Ele sabe que a concretização do amor consegue-se apenas na realização das virtudes.

O amante deseja ardentemente o bem estar do amado, deseja-o livre, livre para amar num viver todo amor. Não escraviza, não explora, nada teme, tudo deseja na medida em que for um bem, e só um bem.

O amante nunca poderá ser homicida ou suicida. Amar é vida.

O amante não muda os seus gostos ou tendências, nem a personalidade ou a postura espiritual. O amor é por si mesmo divino.

O amante não mente porque o amor exige a verdade. Sem verdade não há amor, e sem amor não há verdade.

O amante não é uma pessoa perigosa, violenta ou apática. O amante possui a verdadeira consciência da realidade. Por isso, não conhece o ciúme, é todo confiança, todo discernimento, todo compreensão.

Não existe a ilusão amorosa. No amor tudo é real, verdadeiro e claro.

Movida pelo amor, uma multidão age segundo os fins do bem com o discernimento da paz e da luz.

Quando a humanidade viver em amor teremos a Grande Fraternidade.

É este o binómio que alicerça a feitura deste trabalho. O amor é um sentimento enganador, cheio de imperfeições, versus o amor é um deus, o amor é perfeito. Desta forma, vamos estar em presença do jogo entre o lado humano e divino de um sentimento que por sua própria natureza não se define, não se encerra em nenhum preceito, por mais belo e puro que seja.

Só Deus é Amor.
(Continua)
Margarida Azevedo
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Referências Bibliográficas
PLATÃO,Fedro,Guimarães e Cª Editores,1981,Lisboa, pp.22-23,61.

A DEMONSTRAÇÃO IMPOSSÍVEL DE HARRY HOUDINI

Nota Prévia

" Independentemente de que um fenómeno se possa reproduzir fraudulentamente, isso não demonstra que seja necessariamente uma fraude. Creio na evidência. E nada mais!"
LOMBROSO, César, Hipnotismo e Mediunidade, FEB, RJ, 1983, 3.ª ed.

"Una de las claves de la magia es que no crea fenómenos paranormales, sino ilusiones de esos fenómenos."

Dedico este artigo a todos aqueles que acreditam em tudo o que vêem e ouvem, quando e principalmente esses "estranhos" fenómenos acontecem dentro das suas doutrinas. Considero o trabalho que se segue uma das ferramentas para a construção de uma postura mental despreconceituosa, livre e crítica, e principalmente emancipada face à credulidade que por todo o lado prolifera. Como pessoas dedicadas ao estudo do Ilusionismo, Magia Mental e Mentalismo, nós (a minha família e eu) nem sequer acreditamos naquilo que vemos, em cerca de 90% das ocorrências.
Para quem tiver dúvidas no castelhano, aconselhamos o tradutor. Para alguma dúvida linguística que persista, é favor contactar este blog.
Margarida Azevedo

La demostración imposible de Houdini


Durante algunos años, el mago Harry Houdini y el escritor británico Sir Arthur Conan Doyle, creador de las historias de Sherlock Holmes, fueron amigos. Uno era un archi-escéptico (Houdini), mientras que el otro era un ferviente creyente del Espiritualismo (Doyle).

Posiblemente esperando demostrar a Doyle lo fácil que era verse engañado por mediums, Houdini ofreció a su amigo una extraordinaria demostración, en su propia casa, en presencia de Bernard M.L. Ernst, amigo de Houdini y abogado. Las memorias de Ernst revelan lo que sucedió aquella noche.
Mene, mene, tekel upharsin
Houdini fabricó lo que parecía una pizarra normal, de unos 45 centímetros de largo por 38 de alto. En dos esquinas de esta pizarra se habían practicado agujeros y a través se estos agujeros se habían pasado cables. Estos cables tenían varios pies (un pie equivale a unos 30cm) de longitud, y se habían unido ganchos a los otros extremos de los cables. Los únicos accesorios eran cuatro pequeñas bolas de corcho (de unos dos centímetros de diámetro), un tintero lleno de tinta blanca, y una cuchara de mesa.

Houdini pasó la pizarra a Sir Arthur para que la examinara. Se le pidió que suspendiera la pizarra en mitad de la sala, a través de los cables y ganchos, dejándola libre para balancearse, a varios pies de distancia de cualquier cosa. Para eliminar la posibilidad de conexiones eléctricas de cualquier tipo, se pidió a Sir Arthur que colgase los ganchos del lugar de la sala que quisiera. Colgó uno sobre el borde del marco de un cuadro, y el otro en un gran libro, en una estantería de la biblioteca de Houdini. La pizarra de esta forma podía balancearse libremente, en el centro de la sala, quedando soportada por los dos cables que pasaban a través de los agujeros en sus esquinas superiores. La pizarra fue inspeccionada y limpiada.
Houdini entonces invitó a Sir Arthur a examinar las cuatro bolas de corcho del platillo. Se le pidió que seleccionara la que quisiera, y, para demostrar que no estaban preparadas, a que las cortara en dos con su cuchillo, de esta forma verificando que eran simples bolas sólidas de corcho. Todo se hizo sin problemas. Otra bola fue seleccionada entonces, y, mediante la cuchara, se colocó en la tinta blanca, donde fue removida hasta que su superficie quedó igualmente cubierta con el líquido. Se dejó entonces en la tinta para que absorbiera tanto líquido como fuese posible. A petición de Houdini, Sir Arthur se llevó las otras bolas con él para examinarlas.
“¿Tiene un trozo de papel en su bolsillo y algo con lo que pueda escribir?”, preguntó Houdini a Doyle. Tenía un lápiz.
“Sir Arthur”, continuó Houdini, “quiero que vaya fuera de la casa, pasee a dónde guste, tan lejos como quiera y el cualquier dirección; entonces escriba una pregunta o frase en ese trozo de papel; póngalo de nuevo en su bolsillo y vuelva a la casa”.
Doyle obedeció, anduvo tres manzanas y giró una esquina antes de escribir sobre el papel. Cuando regresó, Houdini le invitó a tomar la cuchara y remover la bola de corcho, que había estado empapándose en tinta blanca, y luego tocar la bola con el lado izquierda de la pizarra. La bola quedó “pegada” allí, aparentemente por su propia voluntad. Lentamente comenzó a rodar por la superficie de la pizarra, dejando un rastro blanco conforme lo hacía. Conforme la bola rodaba, se vio que escribía las palabras: “Mene, mene, tekel upharsin”, las mismas palabras que Doyle había escrito. Los invitados quedaron sin habla.
Houdini se volvió hacia Doyle y dijo: “Sir Arthur, he dedicado una gran cantidad de tiempo e imaginación en esta ilusión; he estado trabajando en ella, una y otra vez, todo el invierno. No le voy a decir cómo la he realizado, pero puedo asegurarle que es un truco. Lo he realizado por medios perfectamente normales. He ideado esto para demostrarle lo que puede hacerse en estas líneas. Ahora, le ruego, Sir Arthur, no llegue a la conclusión de que ciertas cosas que no ve son necesariamente “sobrenaturales”, o realizadas por “espíritus”, simplemente porque no pueda explicarlas. Esta es una maravillosa demostración como ha podido ser testigo, dado que ha comprobado los elementos, y puedo asegurarle que lo he realizado mediando trucos y nada más. Tenga, por tanto, cuidado en el futuro, al asignar fenómenos simplemente porque no puede explicarlos. Le he ofrecido esta prueba para advertirle de la necesidad de cautela, y sinceramente, espero que saque beneficio de la misma”.
“Sir Arthur”, recuerda Ernst, “llegó a la conclusión de que Houdini en verdad logró esta hazaña mediante ayuda psíquica, y no se le pudo persuadir de otra cosa”. La reacción de Doyle, y el rechazo a considerarlo un truco incluso cuando fue admitido por el mago, era tan típica, apunta Houdini, que “es poco sorprendente que su creencia en el Espiritualismo sea tan implícita.”
El secreto de Berol
El secreto del truco permaneció como un misterio hasta que el mago e historiador Milbourne Christopher lo reveló en su libro Houdini, A Pictorial Life. “Ni Doyle ni Ernst”, escribió Christopher, “pudieron desvelar el misterio. Habrían quedado menos sorprendidos si hubiesen visto al amigo de Houdini, Max Berol, realizarlo en Vaudeville”. Berol lo había estado realizando durante años, tanto en Europa como en América, un acto en el que una bola manchada de tinta escribiría en una pizarra aislada las palabras gritadas por miembros de la audiencia:
“Berol hizo esto cambiando la bola de corcho sólido por una con un núcleo de hierro. Un imán en el extremo de una vara, manipulado por un ayudante oculto tras la pizarra, provocaba que la bola se adhiriera y se moviese aparentemente por su propia voluntad. Después de que Berol se retirase, Houdini compró el equipo. Un ayudante en la sala adyacente a la biblioteca de Houdini había abierto un pequeño panel en el muro y extendió una vara con un imán a través del mismo. La bola de la pizarra tenía un centro de hierro, por supuesto.
Ernst no había recordado que cuando Doyle volvió a la sala, después de haber escrito las palabras fuera, Houdini había hecho una comprobación para asegurarse de que el trozo de papel estaba en el que había escrito Doyle estaba doblado, entonces se lo devolvió inmediatamente a su amigo. Antes de hacer esto, el mago había intercambiado los papeles. Mientras Doyle estaba ocupado recuperando la bola del tintero y llevándola a la pizarra, Houdini leyó las palabras. Su conversación dio la indicación al ayudante oculto. Una vez que el mensaje estuvo escrito en la pizarra, Houdini pidió el papel a Doyle para verificar las palabras. Abrió el papel en blanco, simulando que leía las palabras del mismo, y luego volvió a cambiarlo por el original mientras retornaba el papel original a su amigo. Más tarde, Houdini explicó este proceso de intercambio durante unas charlas públicas sobre mediums fraudulentos”
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Massimo Polidoro
in: Ciencia Kanija,Out.2008

sexta-feira, abril 22, 2011

COISAS QUE NOS ACONTECEM E QUE DEVEM SER PARTILHADAS


Era Domingo. Era o fim de tarde. Estávamos todos em casa.

O dia não tinha sido dos melhores. Não porque tivesse acontecido alguma coisa desagradável, mas porque tão simplesmente não estávamos nos nossos dias. No entanto, algumas preocupações assolavam-nos, o trabalho, a vida, o dia-a-dia, enfim.

Quando íamos pôr a mesa para jantar, eis que de repente batem à porta. Fui abrir e duas raparigas jovens, uma americana e outra brasileira, muito alegres, saúdam-me:

- Boa noite. – dizem quase em uníssono.

- Boa noite, - respondi.

- Andamos a divulgar a Palavra de Deus! Como já é um pouco tarde, importa-se que façamos apenas uma oração? – perguntou a rapariga brasileira.

- De forma alguma! – exclamei com estranheza. – Fazem favor de entrar, (eu sei que quem anda de porta em porta em trabalho religioso não pode entrar nas residências, por ser perigoso para os missionários, no entanto fi-lo com toda a espontaneidade).

As raparigas entraram na casa-de-jantar, saudaram o meu marido e a minha filha, que entretanto acabavam de pôr a mesa, e olharam imediatamente para uma mesinha que temos junto ao móvel da sala.

- Os senhores têm ali uma Bíblia aberta. Estou a ver que são uma família crente! – diz a americana com alguma estupefacção.

-Sim, temos uma Bíblia sempre aberta. Todos os dias passo uma página. – esclareci.

Ainda falámos um pouco, sobre a Bíblia, sobre a fé. Depois as raparigas perguntaram se nos podíamos ajoelhar e fazer a oração. Nós aceitámos. A brasileira dirigiu, em palavras simples e espontâneas, durante sensivelmente 10 minutos. Depois levantámo-nos. As raparigas despediram-se, felizes. Perguntámos-lhes se queriam comer alguma coisa. Não aceitaram, já era muito tarde. Nunca mais as vimos.

Hoje, a mesma organização bateu-nos à porta. Estou sozinha com a minha filha. Apesar de ser Sexta-feira Santa, o meu marido teve que trabalhar. Desta vez um angolano, e uma brasileira também.

- Boa tarde. Já ouviu falar da Bíblia? – perguntou a senhora brasileira.

- Já sim. - respondi.

Entre a exposição, que oiço sempre com o máximo interesse, ofereceram-me um livrinho de comentários bíblicos. No calor da conversa, o senhor angolano disse:

- Sabe, o mais importante para se entrar no Reino de Deus é praticar boas obras. Só a fé não basta. Temos que nos amar uns aos outros, sermos amigos, pois só assim somos dignos de sermos chamados filhos de Deus. Não acha?

- É exactamente isso. – respondi com interesse.

- Tem Bíblia em casa? – perguntou-me o senhor.

- Tenho várias. – respondi - Por acaso a da vossa organização é a que está sempre aberta, sobre uma mesinha na casa-de-jantar.

Ficando com o ar mais espantado, deram largas à divulgação da sua Doutrina. Por fim, convidei-os a entrar, que com algumas reservas aceitaram, (o que é perfeitamente compreensível, pelas razões supra mencionadas), e verificaram que era verdade o que eu dizia. Depois foram até ao meu escritório, admiraram-se com a minha biblioteca, sobretudo pela variedade de livros sobre religiões e, principalmente, com as diversas traduções da Bíblia. Quando disse que uma era a tradução dos Capuchinhos, o senhor angolano mostrou todo o interesse pois há imenso tempo que estava para comprar uma também, mas ainda não tinha encontrado. Eu disse-lhe que a livraria católica Paullus tinha muitas à venda. Expliquei onde ficava, e o senhor agradeceu.

Assim, aquela oração deixou na minha casa um ambiente de incalculável bem-estar. Jantámos repletos de felicidade, numa paz impossível de descrever. Hoje à tarde, conversámos sobre a Palavra de Deus e as traduções da Bíblia, como bons amigos.

Em suma, a oração veio repor a leveza espiritual que nos estava a faltar, hoje duas pessoas ficaram de ir comprar uma Bíblia a uma livraria católica, informados por uma espírita e sendo eles Testemunhas de Jeová. Que mais posso dizer?

Apenas esta prece:



Obrigada, Senhor, por estas visitas tão inesperadas, tão súbitas, como súbito e inesperado é o Amor, apesar de sermos tão densos e ser tão fraca a nossa fé.

Obrigada pela alegria da Tua visita, sem hora marcada, sem rosto conhecido, sem receios nem desconfiança. A Tua visita que é toda Palavra, toda Entrega, toda Amor.

Obrigada pela mesa, que queres que seja sempre de Paz, em Família, para a qual a Prece é o aperitivo saboroso e regenerador.

Obrigada por nos prometeres o Banquete no Teu Reino, bastando apenas o muito amar.

Obrigada pela Tua presença em cada irmão, em que Te transportas na renovação de cada Páscoa, símbolo da Vida que vence a Morte.

Obrigada por sermos tão diversos e tão diferentes, pois assim nos presenteias com a multiplicidade de caminhos para o Teu Reino, à semelhança da infinidade de rios e seus afluentes que correm todos para o mar.

Esta Páscoa ficou mais enriquecida, a Primavera mais florida e a Tua presença uma certeza absoluta.

Obrigada pelas agradáveis Surpresas do Céu, pelo Universo estrelado que nos aguarda.

Renovação de votos de Páscoa maravilhosa.



Margarida Azevedo

terça-feira, abril 19, 2011

PÁSCOA, O TRIUNFO DA VIDA!


Desejamos a todos os povos que celebram a Páscoa, cristãos e não cristãos, muita paz.

Se para os povos pagãos da Antiguidade ela representava a passagem do Inverno para a Primavera, no eterno retorno da Natureza no zig-zag do velho sempre novo, assim deve continuar a ser. A Páscoa da Antiguidade era a celebração do renascer, a festa em honra da vida em todo o seu esplendor.

Assim, que todos celebrem a Natureza, porque ela é obra de Deus, é ela que nos faz respirar e nos alimenta, e é por ela que caminhamos em Corpo e Espírito em digressão pela vida.

Renovem-se e cresçam igrejas e congregações, homens e mulheres em bem-fazer, em vontade de bem sem fim.

Todos os dias nascemos, crescemos e morremos em tantas coisas que nos vêm à mente, em tantas acções, tantos gestos.

Prossigam no vosso caminho pela vida em amor, sempre em amor, e deixem morrer a falta de esperança, a fraqueza, o medo do triunfo do outro. A vitória de uns pode ser a lição de vida para outros, o apoio nos momentos inglórios.

Que os templos sejam de flores, emanem aromas e cores em hinos à Natureza, de preces em louvor do Altíssimo.

Cantem a Deus libertador das trevas e da escravatura, o Deus da Promessa e da Revelação, da Luz e da Fraternidade entre todos os povos.

Esse Deus que é inteligência suprema, que é causa primeira de tudo quanto existe, que nos enviou o Seu filho para dar testemunho da Verdade, a certeza do Seu amor. Cantem em Seu louvor e glória.

Vivam a festa da libertação do Espírito, celebração da passagem da morte para a vida, a alegria da certeza de uma vida sem fim.

Apaguem as diferenças ideológicas, vejam em cada homem e em cada mulher um filho ou uma filha do mesmo pai, com os mesmos direitos e deveres.

Celebrem esta Páscoa empenhando-se com todas as forças na passagem da guerra para a paz, do desentendimento para a união, da desconfiança para a certeza.

É o poder de Deus que está entre nós, é um sentido novo para todas as coisas, é a Primavera na alma de todos os homens e de todas as mulheres. É a Vida e é o muito amar.

Tenham todas as religiões, todas as igrejas, todos os homens e todas as mulheres uma santa Páscoa e apressem-se na reconciliação com quem possam ter algum diferendo. Isso não tem qualquer importância, só retarda a vivência libertadora do Espírito que anseia por uma existência mais etérea, uma casa melhor nas infinitas moradas do Reino de Deus.

Que Deus esteja convosco.

Que os vossos pensamentos e acções estejam com Ele.

Hoje e sempre.

Ámen.
Margarida Azevedo

A MUNDIVIVÊNCIA DOS NOSSOS AFECTOS

(Continuação)
Estar neste mundo é senti-lo enquanto meio para um fim mediante um colorido que não é de todo daqui. Por outras palavras, o conjunto de todas as pessoas é a pluralidade dos mundos afectivos, jogo convergente de infinitas casas mentais, projecto do Espírito que pretende superar-se.


É pelo afecto que nos tornamos semelhantes e diferentes, primeiro pelo muito querer, segundo pelo modo de querer.

A afectividade remete-nos ainda para uma questão, a saber: Como equacionar o problema do amor? Tudo o que sentimos é amor. A amizade, o sentimento profundo da alma, o desejo inexplicável que manifestamos por alguém, aquela luta contra a solidão. Até o ódio, a inveja ou o ciúme, o desprezo, a ira... Tudo são formas de manifestar amor, ainda que algumas se encontrem nos trilhos amargos de quem por hora tece os primeiros raios do sentimento todo luz.

O amor implica um desdobramento, o mesmo é dizer, revela ao homem um conceito de pessoa sem dúvidas nem incertezas. Não duvidamos de que somos focos de amor. Que sentido tem falar de um homem à margem do amor? Isso não tem nem faz qualquer sentido.

Pelo amor, o homem desvincula-se da realidade que o circunda e realiza-se. Somos o que somos, seremos muito mais, infinitamente mais, na medida em que desmesuradamente amarmos. O amor é uma forma de reacção às coisas assente em uma outra forma de sentir, ou na única forma de sentir.

Habituámo-nos a ter o amor como uma realidade à parte, como se fosse possível viver fora do amor, ou existir o que quer que fosse fora dele. Aliás, o trabalho das religiões e de toda a mística em geral consiste precisamente em conduzir o homem ao encontro dessa suposta realidade à parte. Talvez por isso a missão veio a falhar, culminando em descrença, dúvida e cepticismo, materialismo e “ateísmo”.

Não há qualquer realidade à parte. O Espiritismo ensina a construir um paraíso aqui, que o amor não é do lado de cá, nem de lá. O amor não tem lados, porque não há dentro nem fora do amor. Tudo o que construirmos aqui, será uma benção no mundo dos Espíritos, resultado de actos que têm o mesmo impacto e a mesma força, estejamos nós onde estivermos.

Que representação temos do amor? O amor é uma perspectiva. O cosmos, povoado de uma infinidade de astros, representa a perspectiva em face de uma ordem pré estabelecida, uma ordem prática que encerra os segredos do universo, do sentido que possuímos das coisas. E desse sentido, o mais importante consiste em termos a noção de que existir é transportar a experiência desses astros para a nossa memória. Só ela é fonte de racionalidade, noção de ordem e de lei. É pelo amor que sabemos que racionalidade, ordem e lei presidem a todas as coisas, geram todas as coisas por todo o sempre.

O amor tem a sua própria fenomenologia. Por isso nos modificamos na medida em que desejamos com fervor. O amor é o vazio porque nada o preenche, nada o satisfaz, nada o sacia. O amor é ele mesmo sem mais. Adaptamo-nos ao desejado, queremos agradar-lhe porque o vemos eivado de luz. O amor é um desejo deslumbrado para o qual os sentidos são meros sentidos.

A teoria das reencarnações ensina que o amor também é reminiscência, não apenas futuro. Pelo amor lembramo-nos ou rememoramos parte de um passado do qual ainda não fomos de todo protagonistas de paz. Por essa reminiscência nos damos conta do essencial da alma, que viver é algo que cresce à medida que a vida se revela toda amor, sem reservas nem recordações de tempestades perdidas nos confins das lágrimas do sofrimento. Aliás, a vida é a mor a des-cobrir-se, sentimento que nos mostra a nossa natureza de deuses no embrião de um amor ainda infantil, tão carente de amparo e tão frágil. É pelo afecto todo amor que estabelecemos a ponte entre o presente e o passado rumo a um futuro todo luz.
(Continua)
Margarida Azevedo

quinta-feira, abril 14, 2011

História de Jesus segundo o Islamismo e Evangile Incompris - Esclarecimento

Estimados Amigos
Sempre fui uma acérrima defensora dos Direitos de Autor, pois entendo que estes representam a justa remuneração pelo trabalho dos autores.
Quando encontro trabalhos em locais de partilha da internet, no You Tube por exemplo, parto do principio que, quem os publica não está a violar os Direitos de Autor e que estes trabalhos são de divulgação livre.
Porém, às vezes tal não acontece, e na nossa boa-fé, utilizamos material que foi colocado nas redes de partilha sem a devida autorização dos seus autores.

Foi o que aconteceu com o video A História de Jesus segundo o Islamismo, do qual fiz um link para o meu blog, pois no mesmo não havia qualquer referência sobre a sua utilização. Fui agora confrontada com o facto dos 8 videos desta série terem sido retirados do You Tube por violação dos Direitos Autorais. Aos autores dos referidos videos (que desconheço quem são), apresento o meu pedido de desculpas pela sua utilização, pois a mesma foi de boa-fé e desconhecia que estava indirectamente a violar o Direito de outrém.
Quanto ao video Evangile Incompris, foi o mesmo retirado do Daily Motions pelo seu autor.
Aqui fica o esclarecimento
Um abraço fraterno
Margarida Azeevedo

terça-feira, abril 12, 2011

SOBRE O CONHECIMENTO CIENTÍFICO


Interrompo aqui a prelecção que hei começado, subordinada ao tema da afectividade, para proceder, dentro dos meus parcos conhecimentos, ao esclarecimento sobre o que é ou o que se pode considerar ciência. Fá-lo porque que há nos meios espíritas, mesmo entre os mais conceituados seguidores, uma noção de ciência que me parece desconforme com o seu real significado.

O facto talvez se deva à matematização da realidade, excessiva, acrescente-se, levada a efeito por uma larga franja de gente ligada à ciência. No entanto, não podemos considerar a Matemática como a única ciência, muito embora a sua indiscutível importância. Tomemos um punhado de exemplos como ilustrativos dessa verdade: sem Matemática andaríamos nus e descalços, pois não conseguiríamos tirar as medidas ao corpo, não teríamos mobílias, nem livros, nem automóveis e, é claro, nem toda a maquinaria que por aí existe e que se desenvolve que nem cogumelos… Por outro lado, se apenas estudássemos Matemática nada saberíamos de Literatura, Teologia, Exegese, Arte, Axiologia…E se a Matemática está em tudo, como costuma dizer-se, não é menos verdade que, se está em tudo é porque faz parte de… não é o próprio tudo.

Desta forma, o conceito de Ciência não é, nem pode ser, sinónimo de Matemática. Vai muito para além disso. O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa define-a deste modo: “1 conhecimento atento e aprofundado de alguma coisa (…) 1.1 esse conhecimento como informação, noção precisa; consciência (…) 1.2conhecimento amplo adquirido via reflexão ou experiência (…) 2 processo racional us. pelo homem para se relacionar com a natureza e assim obter resultados que lhe sejam úteis (…)3 corpo de conhecimentos sistematizados que, adquiridos via observação, identificação, pesquisa e explicação de determinadas categorias de fenómenos e factos são formulados metódica e racionalmente (…)” No Dicionário Universal da Língua Portuguesa, Nova Edição Revista a Actualizada, temos: “conhecimento rigoroso e racional de qualquer assunto; corpo de conhecimentos, sobre um determinado tema, obtido mediante um método próprio; domínio organizado do saber; conjunto organizado de conhecimentos baseados em relações objectivas verificáveis e dotados de valor universal; o conjunto das ciências; (…)” . E no Petit Robert, ciência significa: “I. 1.º Connaissance exacte et approfondie cience du bien et du mal (Bible). Science de l’ avenir. V. Prescience. Savoir qqch. de science certaine, par des informations sûres (...) avoir de la science infuse. Littér. Ensemble de connaissances, d’ expériences . V. Savoir. 2.º Ce qu’ on sait pour l’ avoir appris, connaissances étandues sur un objet d’ étude d’ interêt général.(...) * Em grego, no dicionário de Português-Grego, Grego-Português, o conceito de ciência subdivide-se em conhecimento – episteme – e conhecimento adquirido pelo estudo – mathema ; sophia - Para a episteme são remetidos os conhecimentos científicos em geral, para a mathema e para a sophia, as matemáticas e o saber, num sentido de sabedoria, interrogação sistemática sobre a origem e natureza última de todas as coisas. Esta associação entre a Matemática e a Sofia tem a ver com o facto de que, para o mundo grego (helénico/dialecto ático) a Matemática era uma ciência que contribuía para o desenvolvimento do espírito crítico.

Penso que se pode dizer, sinopticamente, que Ciência é o estudo aprofundado e sistemático de determinada matéria.

Lamentavelmente, muito embora o Espiritismo seja uma doutrina aberta ao conhecimento, promovendo a curiosidade e o espanto com tudo o que acontece, seja do mundo visível seja do invisível, a verdade é que os espíritas estão cada vez mais fechados em si próprios, mercê da onda de negatividade que prolifera dentro da Doutrina, fechando-a ao saber, excluindo determinadas ciências por puro preconceito, ou, o que é pior, sem nunca terem lido um livro sobre as mesmas. Porque baseados apenas em psicografias, grande parte cheias de erros, julgam ficar detentores de tudo o que há para dizer nessas áreas. É pena. A psicografia nem tão pouco tem essa função, mas a de despertar o interesse e o gosto pelo aprendizado; a psicografia não substitui, nem poderá nunca substituir, o cientista pois que o aprendizado vem pelos nossos próprios méritos e de acordo com o nosso merecimento. Poderá ser um apoio, uma ajuda, preciosa, acrescente-se, mas não mais do que isso. E já é muito bom.

Ora, em Espiritismo não se pode dizer que há saberes que não servem para nada, ou que cientistas, que dedicaram toda uma vida à descoberta ou investigação em determinadas áreas, não significam nada. O Espiritismo é uma doutrina de humildade, ou é científico ou não tem razão de existir, estando, por isso mesmo, depende, como qualquer religião ou igreja, dos saberes paralelos. Não podemos cair naquilo que criticamos nas outras organizações e fazer ainda pior. Dizer que o estudo da Bíblia não faz falta, ou que a Exegese é perfeitamente dispensável, é exactamente a mesma coisa que dizer que a Terra não se move ou queimar na fogueira quem disser que Jesus não é Deus. Os autores dos Quatro Evangelhos foram teólogos portadores de influências, entre elas, a transmissão oral e sacerdotal rabínica, apresentando-nos teologias em conflito, cristologias muito diferentes, apesar das relativas semelhanças entre os três sinópticos (Mt, Mc e Lc).

O mundo já teve, pensamos, a sua quota-parte de homicídios por motivos religiosos, guerras santas, segregações de toda a ordem. O Espiritismo tem que marcar a diferença pela coerência das suas posições, pela tolerância dos seus seguidores, e pelo desejo insaciável em conhecer cada vez melhor a vida, com tudo o que dela faz parte.

Para que Roger Perez afirme, na homenagem a A. Kardec em L’ evangile selon le Spiritisme, “que a pura doutrina de Jesus de Nazaré foi de alguma forma alterada durante séculos de interpretações interesseiras” (trad. nossa), é porque teve acesso a essas mesmas interpretações, as quais lhe chegaram mediante os escritores/estudiosos versados sobre essas matérias.

Para fundamentarmos as nossas opiniões, precisamos de ler, e ler fora dos nossos meios, caso contrário deixamos que nos passe ao lado o mundo em que vivemos. A segregação e o fundamentalismo são formas de xenofobia como outras quaisquer... São como viajar num transporte público e só olhar para os que são da nossa raça. Além disso, o Espiritismo é uma doutrina de origem pluralista, como afirma Kardec (op. cit., p. 15). Tudo é absolutamente necessário, mesmo o que por momentos nos parece estapafúrdio. Quem persistir no isolamento só lhe resta uma solução: faça uma fogueira e queime os livros.

Muita paz

Margarida Azevedo

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*“1.º conhecimento exacto e aprofundado ciência do bem e do mal (Bíblia). Ciência do futuro. V. Presciência. Saber qq coisa com perfeito conhecimento de causa, através de informações seguras (…) ter a ciência dos que julgam possuir o que não estudaram. Lit. Conjunto de conhecimentos, de experi^ências. V. Saber. 2.º Aquilo que se sabe por ter aprendido, conhecimentos alargados sobre um objecto de estudo de interesse geral.” (trad. nossa).


Referências bibliográficas
Instituto António Houaiss de Lexografia, Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, Círculo de Leitores, Lisboa, 2002, p. 926.

Dicionário Universal da Língua Portuguesa, Nova Edição Revista e Actualizada, Texto Editora, Lisboa, p. 353.

ROBERT, Paul, Le petit Robert, Diccionnaires Le Robert, Paris, 1990, p. 1778.

S.J., Isidro Pereira, Dicionário Grego-Português e Português-Grego, Livraria A.I., Braga, p. 778.

KARDEC, A., L’ Evangile selon le Spiritisme, Les Éditions Philman, Paris, p. 15.

domingo, abril 10, 2011

HISTÓRIA DE JESUS SEGUNDO O ISLAMISMO - NOTA

Entre os vários videos disponíveis sobre o tema em título, selecionei especialmente este por duas razões:
Jesus é apresentado como descendente de Ismael, o filho de Abraão com a escrava Agar; Jesus afirma que o Consolador prometido é Maomé.
Objectivo Geral:
Informar os meus leitores sobre estes pontos de vista.
Objectivos Específicos:
Mostrar como os mesmos textos e o mesmo Profeta são susceptíveis de interpretações diferentes.
Demonstrar que o Espiritismo não é a única doutrina a auto-atribuir-se o Consolador Prometido por Jesus.
Informar que Jesus é um Profeta importante e de referência para outras religiões, que não apenas o Cristianismo.
Fazer despertar o interesse sobre outras religiões, neste caso o Islamismo.
Sobre este assunto, remeto o leitor para uma psicografia de F.C.Xavier:
"- Qual o vosso objetivo, atualmente no Brasil?
- Venho visitar a obra o Evangelho aqui instituida por Ismael, filho de Abraão e de Agar, e dirigida dos espaços por abnegados apóstolos da fraternidade cristã."(1990,pag 123)
Lamentavelmente, o assunto do video tem sido abafado pelos Cristãos, mas não pelos Islâmicos.
Não podemos nem devemos temer a diferença de opiniões, pois elas são uma mais-valia não apenas em termos científicos, mas também como alicerces da fé.
Muita paz
Margarida Azevedo

Referências bibliográficas
XAVIER, F.C., Crônicas de Além-Túmulo,(pelo espírito Humberto de Campos), FEB, RJ,1990 cap.20,p.123.

sábado, abril 09, 2011

A MUNDIVIVÊNCIA DOS NOSSOS AFECTOS

(Continuação)

A história da nossa afectividade é, por excessos ou incúria, ignorância ou falta de autoestima, a história da nossa agressividade. Somos naturalmente agressivos, ou pelo menos propensos a actos pouco ou nada pacíficos. E isso é de tal modo importante que um dos valores centrais da nossa pós-modernidade é precisamente a agressividade. Levantar a voz a alguém porque reclama de uma injustiça ou de um mal entendido, conseguir um emprego estável, progredir profissionalmente, a própria forma de estar dentro de uma unidade escolar, quer para alunos, quer para professores e auxiliares de acção educativa, são alguns dos aspectos mais banais da agressividade.

O mundo tem criado espartilhos onde vencer é derrubar alguém, porque fraco, incompetente, ou simplesmente diferente ou regido por outros padrões culturais. A agressividade alimenta os desníveis, aumenta o controlo entre tudo o que é produzido, seja em uma fábrica ou empresa, seja na própria escola.

Por isso, há quem fale agressivamente de afectividade, há quem faça da agressão a razão forte, o meio de chegar mais longe, a energia milagrosa para atingir um alvo que se pretende traduzido em felicidade. Se passarmos em revista alguns dos artigos de oferta de emprego, nos jornais, deparamos com discursos verdadeiramente apelativos da agressividade:

“Se é ambicioso, se tem espírito de luta, se não é tímido, se é inteligente... Então você é a pessoa que procuramos.” É evidente que a ambição, o espírito de luta, a ausência de timidez, a inteligência, são as peças do xadrez da agressividade qual chave-mestra para o lugar, uma forma airosa e sub-reptícia de exigir que o candidato seja esperto. Se acrescermos o facto de que o emprego é para gente jovem, geralmente muito jovem, então o concorrente idoso, com trinta e poucos anos de idade, sente o peso da exclusão, da fraqueza e da inutilidade dentro de um mundo que se tornou apertado e onde parece estar a mais. Desta forma se constróem patologias em laboratório social, onde a exclusão é elemento-base do quimismo do potencial bombástico da agressão.

Assim, afecto e agressão misturam-se e indiferenciam-se, são indistintos. A agressão usa vulgarmente o afecto como ferramenta de fácil manuseamento para atingir os seus objectivos. O afecto passa à agressividade quando não consegue fazer-se corresponder. Afecto e agressão necessitam-se mutuamente para estabelecer o equilíbrio entre meios, objectivos e fins atingidos. E quando alguma coisa falha, habitualmente não perguntamos contas ao afecto, ninguém diz que perdeu uma oportunidade porque talvez tenha sido pouco afectuoso. É para a agressão que remetemos a nossa crítica feroz, ou seja, perdemos uma oportunidade porque não fomos suficientemente agressivos.

De facto, não sabemos como nem porquê, mas andamos à revelia da justiça. Exigimos demais da agressividade quando, muito justamente, seria à afectividade que deveríamos perguntar razões. Não nos lembramos, ou ainda não aprendemos que, perder oportunidades acontece quando precisamente algo não está bem ao nível do afecto. A falta de autoestima ou os excessos, como acima fizemos referência, são parte importante dos nossos falhanços. Talvez por isso, tenhamos tanta dificuldade em destrinçar afecto e agressão nesta luta de contrários em que, sabemo-lo, um vencerá o outro, definitivamente. Pelo menos é o que parece.

E apenas parece. O pensamento reencarnacionista diz que ainda não atingimos os níveis satisfatórios de afectividade, apenas satisfatórios. Diz esse pensamento que a afectividade, nas suas formas mais elevadas, ainda não faz parte do nosso mundo. É a agressividade que domina a humanidade porque perdida na confusão entre o que é Espírito e o que é Matéria. Isto significa que, na indefinição, não optamos por tomar uma decisão pacífica, escolhemos sempre a agressão em nome daquilo que pensamos ser amor por nós mesmos.

Porém, ela é escola, mola impulsionadora da força que a irá extinguir. Assim, à medida que o Espírito progride, a noção de afecto desoculta-se gradativamente até que um dia o Espírito será todo afecto, isto é, o seu agir será uma acção boa. Isso conseguir-se-á num para lá onde impera o Bem. Podemos dizer sem receios que a agressividade é uma forma distorcida de afecto, isto é, o afecto sem luz, tal como o para lá pode ser o aqui/agora, palco das lutas em que o bem forçosamente terá que se sobrepor.

Assim, na casa da afectividade moram os nossos desejos mais íntimos e profundos, as nossas vivências de passados remotos, antiguidade de um tempo perdido nos confins do esquecimento, arquivo na nossa memória.

Desta afectividade sobressaem pensamentos idílicos de amores puros que, segundo a teoria das reencarnações sucessivas, nunca existiram porque imerecidos, por vezes considerados mesmo com alguma relutância. Porém, é pelo imerecido que nos revelamos como somos, isto é, a representação que fazemos de um amor profundo, divinamente puro, o verdadeiro alvo que pretendemos.

Representamo-nos uma realidade por acontecer, ou parece que vivemos por antecipação, ou então agimos segundo uma representação do que não observámos. Há em nós um futuro latente mas que parece ter sido possuído em um outro mundo qualquer, isto é, parece que estamos programados para um futuro ao qual, por algum desarranjo ou desconexão mental, chamamos passado. Vamos a essa realidade imaginária procurar a razão de todas as coisas, o projecto do que pretendemos concretizar.
(Continua)
Referências bibliográficas
Platão, Fedro, Guimarães Editores, Lisboa, 1981 pag. 64, 244 d.
 
Margarida Azevedo

domingo, abril 03, 2011

A MUNDIVIVÊNCIA DOS NOSSOS AFECTOS

(Continuação)
Não será isto, por acaso, uma dupla fatalidade, uma ilusão, um jogo que parece estarmos condenados a perder, inventado para divertir quem parece que não tem mais que fazer? Por que somos programados para não ver? Por que somos investidos de um sentimento que, por sua própria natureza, exige o olvido de tudo, porque adjectivado como pernicioso, sabendo que tal existe, mas que sabendo ignora?


E que natureza ou realidade é a desse inconsciente? Não será, porventura, que ao não aceitarmos uma consciência infantilizada, por vezes mimada, frágil e insaciável, atemporal e deslocada do espaço, remetemos para a única instância que parece desculpar-nos, o inconsciente? Dá tanto jeito falar de inconsciente; dá tanto jeito falar do que ninguém sabe, do que ninguém pode provar. Quem e atreve a dizer sim ou não a actos e pensamentos supostamente oriundos do inconsciente? Quem se atreve a dizer que a infância não teve seu peso nas decisões sentimentais ou afectivas do sujeito que se diz apaixonado? E o papel do pai e da mãe, quem se atreve a por em causa? Quem diz que a família não tem seu cunho de culpa quando alguém afirma ter sido induzido em erro a quando da experiência amorosa? O inconsciente é a confortável e desculpante casa de onde são oriundos os nossos desejos, do nosso aparato axiológico-pedagógico, de um padrão intencional de comportamentos que nos define como seres singulares. É mais aconchegante sermos quem somos pela força do desconhecido, do que aceitando as fraquezas de quem não pode viver sem afectividade, mas que por meio dela se expõe aos maiores dissabores da vida, simultaneamente e por ironia, aos maiores prazeres.

Por outro lado, será que podemos considerar a afectividade uma atitude narcísica? Isto é, um excessivo culto do eu, paradigmático das sensações do mundo, em sua totalidade? Não será que a afectividade pode tornar-se um acto sádico em virtude do culto do personalismo pragmático intolerante e tão profundamente enraizado neste nosso estar social com “qualidade”?

O domínio da nossa afectividade remete-nos para reflexões nada pacíficas porque incoerentes, analógicas a atitudes dos animais, paradoxos de quem pretende à viva força tornar-se gente em um cosmos onde enxameiam miríades de inteligências que desconhecemos, e consequentemente com outras noções ou níveis de afectividade.

Que sabemos de nós mesmos quando amamos e só vemos qualidades desejadas, oníricas, inconscientes, orgásmicas? Que forma de ver é essa, deturpante da mais complexa inteligência, enganadora e tão cheia de desejo, repleta de prazer fantástico sedutor e inebriante?

Que sentimento é este que nos expõe aos mais ardentes desejos de e do saber, desbrava a animalidade e torna o mais obscuro em luz divina? Este trabalho, longe de dar respostas, é uma reflexão dirigida a quem, pelo desejo de muito querer amar, sente que nem sempre o seu coração foi preenchido e saciado com os requintes objectivados pela natural qualidade com que o amor, e só ele, pois nada o substitui, pode com propriedade saciá-lo. Para já, assinalamos três objectivos fundamentais dos capítulos que se seguem: defender um ideal de amor e de paz; combater a solidão; não ter medo de amar. Para isso, defendemos a tese de que quanto mais educado um ser, mais e melhor consegue amar, pois o máximo amor é a máxima educação.

Em que nos baseamos para concretizar estes objectivos? No Evangelho de Jesus a partir deste preceito: “Tudo o que pedirdes ao Pai em Meu nome, crede que Ele vo-lo dará.” Efectivamente, se for amor e paz o alvo dos nossos pedidos, é isso que receberemos. De certeza absoluta.
(Continua)
Margarida Azevedo