OS ESPÍRITOS E A NATUREZA
A imposição do Homem à Nautreza é considerada,
intelectualmente, uma mais-valia para a humanidade. O Homem alterou o curso
natural dos rios, construíu barragens e represas, transportou dos seus habitats
animais e plantas para lugares que a Natureza consideraria inóspitos, cultivou massivamente
a terra, foi aumentando a produção de plantas, e de animais que domesticou,
alterou a constituição orgânica de uma pluralidade de seres, acelerou-lhes o
processo de crescimento; construíu cidades com lagos e jardins artificiais, mudou
tudo e tudo lhe pareceu ser sempre permitido, baseado no grande princípio de
que o Homem é o rei da Criação e todas as outras espécies têm que lhe ser
submissas.
E assim, coroado de vaidade, lá foi reinando, espelhando
na Natureza não propriamente o seu desejo de bem , mas a sua ambição com o nome
de bem. É certo que, nalgumas coisas, a
vida lhe foi sendo facilitda, e é para isso que a inteligência serve: escavar
um poço para ter água junto de casa e precaver-se contra as intempéries, criar
redes de saneamento, plantar e criar
silos para armazenar para o inverno
rigoroso, ou criar animais para o sustento do lar é meritório. Porém, mexer com
as forças intrínsecas da Natureza, alterar os seus propósitos a ponto de até
nem o clima escapar, estamos a falar de outra coisa bem diferente.
Face
aos resultados sobejamente conhecidos e à vista de toda a gente, isto leva-nos
a pensar se não será o humano um erro da Criação ou o ser mais estúpido à face
da terra, pois é difícil aceitar que destrua aquilo de que precisa para a sua
sobrevivência, a começar pelo ar que respira, a água que bebe, expondo-se à
fome, uma natural consequência da sua leviandade. Por outro lado, é difícil
aceitar que a sua evolução passe pelo
prazer de destruir, em nome do lucro fácil, a ponto de se pensar que é a
própria humanidade que neste momento está em perigo de continuar a existir.
Obviamente não é este o sentido de destruição natural, em que a Natureza tudo transforma
num renascer constante e eterno. Neste desnorteio, até esta eternidade natural é
posta em causa, pois até o ciclo das estações do ano foi alterado. As plantas
florescem quando deviam dar fruto, ou morrem secas na aridez dos terrenos
cheios de rachas, os animais alteram o ciclo de reprodução alteram o seu
habitat e mudam-se para outras zonas à procura de água e de alimento.
Pergunta-se:
Será que a evolução humana teria este propósito? Mas o que é a evolução? Se é
isto, dispensa-se, pois se a ignorância e o atraso civilizacional é respeitar a
Vida e o Planeta, então venham eles.
Como
é possível associar o processo evolutivo da humanidade ao fim trágico do mundo?
Que evolução é esta, qual a sua verdadeira fonte, qual o seu verdadeiro rosto?
A que normas e a que regras realmente obedece? Quem é esta humanidade? Estará o
humano condenado a um fim trágico? Por outras palavras, estará a viver a
dimensão do trágico no seu melhor, ao mais alto nível? Para onde nos conduz
esta tão inflamada falta de amor? Estará o humano tão farto de si próprio que
já não se suporta? Que é feito do Homem? Que tem ele contra Vida, porque a
rejeita nesta destruição sem precedentes? Que forças são essas que o movem?
Para onde pensa que vai? O que é que ele quer? Que e qual o horizonte tão ávido
de…nada?!
Caberá
à Natureza impôr-se como o único e verdadeiro universal, no seu sentido mais
lato, mais impenetrável às nossas fracas mentes, um universal cósmico numa hiper-consciência,
toda divino, e que justa e brutalmente se está a revoltar contra a humanidade?
Que seres compõem essa mesma natureza, qual a sua verdadeira identidade que
tanta força têm para se imporem aos humanos, que mais parece que vieram de um
hospício do que de um cosmos perfeito?
Os
animais dão-nos grandes lições de amor e dedicação à Vida. No cumprimento dos
seus deveres naturais para com a Natureza, ensinam aos humanos que esta é para
se respeitar.
E a fé? Qual é o seu papel? Será a fé, também ela, uma
tragédia? Estamos a viver a falência das nossas convicções, dos nossos valores,
a desconstrução dos alicerces que pensávamos profundos. A força converteu-se em
fragilidade e está cada vez mais a vir à superfície a necessidade de uma
humanidade convertida a Deus, bem como ao entendimento com os Espiritos que comandam
o planeta. A fé tem, urgentemente, que mudar, tudo tem que mudar.
Mas,
como, se não se conhece outra coisa que não a dor, a irracionalidade, a loucura?
Ou o pesadelo do sofrimento como o inevitável, a sombra de uma perseguição sem
tréguas?! Quem sabe, talvez esteja aí a solução para a tragédia: há outro
caminho, tem que haver outro caminho que não este banho de sofrimento. É que
não se trata de um sofrer penitencial, catarxico ou reparador. Trata-se de
criar o desconforto sádico, a destruição gratuita, gerar e premiar
comportamenos ao arrepio da ordem natural.
Nesta impotência vocabular e conceptual, sentimos a panóplia
de palavras sem sentido a povoarem as nossas cabeças num painel de
incongruências, de fantasias, de mitos e de filosofias vãs e de fés egoístas. O
que fomos jamais voltaremos a ser. Perdemo-nos. Impotentes perante a realidade
dura, temos que aceitar que, de facto, a destruição é o que melhor nos
caracteriza.
Ah, mas é claro, aqui entra a fé no Deus todo poderoso,
tão mágica, tão colorida. De facto, a fé, nos seus insondáveis labirintos,
acaba por ser também ela uma vítima. A fé também destrói pois, qual cata-vento, tem acompanhado a falta de
amor orientando-se segundo e conforme os interessses egoístas. Acreditar em
Deus, Pai todo poderoso e amigo de todos os seus filhos é uma fé completamente
diferente da de acreditar num deus mágico que vai fazer ressuscitar das cinzas
os rios secos que nem palha, os oceanos cheios de plástico, os animais que já
desapareceram e os que estão em vias de desaparecer; um deus que vai impôr-se à
falta de educação ambiental ou aos genocídeos de povos que tão simplesmente
querem viver na sua natureza.
Esse
deus que vai enviar Espíritos de outras galáxias, imagine-se, que estão a
preparar um corpo perispiritual para entrar na atmosfera terrestre, é o
grito da mais alta ignorância
espiritual, da falta de fé, da maior fascinação que se possa imaginar. É como
sanear as Entidades que tão dedicadamente vêm a este planeta com o propósito de
prover aos desígnios de Deus; é como se conheccessem tudo o que está à nossa
volta, todas as Entidades, e lhes disssessem, desecucadamente, “já não precisamos de vocês porque vocês
falharam. Que tristeza.
Falanges
enormes de Espíritos presidem aos fenómenos da Natureza. Seres que cumprem a
nobre missão do equilíbrio de todas as coisas, em que tudo está em perfeita
harmonia com tudo. São miríades que fazem surgir as tempestades, o raio,
dirigem as marés, orientam os seres para o cumprimento dos seus propósitos,
provendo ao equilíbrio do planeta bem como do seu papel no cosmos.
Isto significa que amar a Natureza é amar quem preside
aos seus desígnios sob ordens de uma Vontade soberana. Tudo tem Deus. Aquilo a
que chamamos a natureza de todas as coisas mais não é que a manifestação da
força divina que a tudo preside, no encadeamneto de géneros e espécies, desde o
átomo ao Espírito mais brilhante.
Devemos à Mãe Natureza, naqueles que a dirigem, a nossa
vida. Vida essa que não está isolada, mas que depende de uma infinidade de
outras vidas para continuar a existir. Devemos-lhe o ar que respiramos, os
alimentos que comemos, a terra que pisamos; devemos-lhe as famílias que
construímos, os nossos filhos, um bem preciosíssimo; as referências
identitárias responsáveis pelos nossos equilíbrios mentais e afectivos. Para
esses Espíritos devem ir sempre as nossas orações de acção de graças, um muito
obrigado clamoroso.
Somos o que respiramos, energia vital que trespassa o
mais íntimo do nosso ser; somos o que comemos, aquilo em que acreditamos, com
que sonhamos. É chegada a hora de voltar
às forças da Natureza, primárias, e recomeçar tudo de novo e repensar a
História Natural, voltar aos Espíritos que presidem às forças do planeta, só
que desta vez sem coroas de falsas glórias, sem reinados ridículos, sem
superioridades de qualquer ordem. O Homem tem que aprender que está na Vida
para obedecer, não para mandar no que está acima de si e que não compreende; há
que perceber que são imensos os mistérios que nos envolvem. Um deles é o de
saber como é que, apesar de tudo, a vida continua. Grande é a força da Vida e
magníficos são os seus mistérios e magníficos os Espíritos que a dirigem.
Espíritos da Natureza, por favor, perdoem-nos porque,
efectivamente, não sabemos o que fazemos.
Margarida Azevedo
Bibliografia
consultada:
KARDEC.,A., O
Livros dos Espíritos, CEPC, Lisboa, 1984, Livro Segundo, Mundo Espírita ou dos Espíritos, cap. IX, Intervenção dos Espíritos no Mundo Corpóreo, IX, Acção dos Espíritos nos Fenómenos da Natureza,
pp.237-239.