MORTE É FELICIDADE XII
VAMOS MORRER
Desde sempre que a morte é vista como uma ocorrência do futuro, certa mas longínqua. Provavelmente uma vingança dos deuses, ficção de Deus, uma herança mórbida de Adão e Eva, um jogo macabro, uma fatalidade, um destino nada honroso. Um acontecimento sempre para depois, para nunca mais, eternamente adiado. No entanto, há em nós uma qualquer sensação que não conseguimos definir que nos leva a pensar que a vida é-nos emprestada; ela acontece como se algo nos trespassasse num ápice, um mero punhado de anos, e nos engolisse de novo para se saciar e cantar vitória.
Por isso dizemos que viver é um desafio, jogo perigoso entre o aqui que vemos de forma distorcida, e o para lá de que não nos lembramos. A vida é uma herança dolorosa, uma construção sólida de um futuro ao qual não escapamos.
No entanto, a morte talvez seja o único acontecimento que merece ser referenciado como “o futuro”, porém nada distante Ela persegue-nos, conhecedora da nossa temeridade, das nossas lutas, das certezas próprias dos incoerentes.
Este paralelismo insólito é responsável pela certeza cruel de que não há nada que nos faça escapar, sobreviver, perpetuar. Vamos definitivamente morrer. Uma desgraça, é verdade.
Mas há quem pense que não. Ou então há quem acredite que a sua hora não chegará enquanto não tiver feito tudo o que acha que tem para fazer. Só que de repente lá se vai o castelo, e Deus é tão injusto. Mata as criancinhas, os jovens, os pais de família, as mães com filhos que ainda mal chegaram ao mundo, gente importante com grandes projectos para a Humanidade... A morte, quando vem, não escolhe. Porquê? Podia levar os que não fazem cá falta nenhuma, os maus, os ambiciosos, os assassinos. Esses são os que ficam sempre para mais tarde.
A morte é assim mesmo. Que sabe ela a nosso respeito, das nossas intimidades mais recônditas? Que percebe dos nossos projectos, que noção tem de Humanidade?
Segundo o Espiritismo, de nada nos serve esta conversa. Nada do que acabamos de dizer faz sentido, pois a revolta, os queixumes ou as desilusões não são bons conselheiros. Só se desilude quem se ilude, e a ilusão é própria da crendice. A vida é objectiva, e a morte ainda mais. Morrer é sobreviver, com regras, com leis muito precisas.
Ninguém escapa a essa realidade porque todos estamos no mundo apenas de passagem, passagem essa cheia de labutas mas que, após o seu cumprimento, somos “puxados” para o mundo a que realmente pertencemos. E isso não é uma questão de mérito, apenas, mas de presente mais passado. Quem reencarnar para uma vida de trinta anos não vive oitenta, mas quem reencarna para oitenta pode reduzir para trinta, e mais facilmente do que pensa.
Essa redução do tempo de permanência na Terra não tem nada a ver com o sofrimento, mas com o modo como este é encarado e vivido. O bem ou mal sofrer definem não só o modo como se vive o tempo que é destinado a uma encarnação, como também o impacto ou força que lhe conferimos face à existência em sentido lato.
Assim, quem tem fé sabe que o desencarne em pessoas ainda jovens significa que terminou um ciclo, que a pessoa não iria beneficiar se permanecesse mais tempo na Terra, que certamente a existência foi encurtada por vias duvidosas, nomeadamente através do consumo de drogas, ou por uma forma de estar socialmente desconexa. Isto significa que a morte, nestes casos, é um benefício acrescido, pois o Espírito é retirado do meio terreno com o propósito de ser tratado no Astral; que lhe foi dada a oportunidade de reencarnar em um meio no qual provou que ainda não estava convenientemente preparado; que a sua presença era de tal modo nociva que, porque fora do âmbito do karma colectivo daqueles com quem convivia mais de perto, não conseguiu subir ao nível, ainda que muito baixo, dos seus semelhantes.
Além disso, e porque é referenciado em O Evangelho segundo o Espiritismo, (KARDEC, A, 1987, p. 93) se entre duas pessoas, uma boa e uma má, desencarnar a primeira e não a segunda, queremos esclarecer que isso é o mais comum e, portanto, nada tem de anormal. Ao bom não é necessário mais tempo de vida porque já evoluiu, ao mau a permanência por mais algum tempo ser-lhe-á benéfica pois ainda tem muito para modificar.
Outro aspecto insere-se no facto de muitos considerarem a morte como uma fatalidade. Ora, a morte não é uma fatalidade. Aquele que vai nadar num rio, depois de ter sido avisado de que este é perigoso porque tem fundões e remoinhos, e morre vítima de um acidente dessa natureza, com apenas vinte anos de idade, não podemos dizer que essa morte foi uma fatalidade. Apenas que não respeitou ou não cumpriu a informação que lhe foi dada. Além disso, mesmo que a morte não ocorra por acidente, mas de forma súbita ou doença incurável, morrer jovem é tão justo como morrer velho, e não há qualquer fatalidade. Segundo a referida obra (pp. 91-92), a morte não é capricho, crueldade, miséria ou perdição. Prolongar uma vida estagnada na evolução, sem objectivos e sem amor é que poderia ser tudo isso, e muito mais. Não tenhamos dúvidas, seria muito mais perigoso para a pessoa viver uma vida inútil.
Quantas não são as mortes que bendizemos e agradecemos a Deus? Quantas não abençoamos afirmando que são uma graça da Divindade, pois aquela vida estava a ser muito sofredora? Querer prolongá-la seria egoísmo, incoerência, falta de amor. Quando tal acontece por doença súbita obedece à mesma justiça e é obra do mesmo Ser. Somos nós que ainda encaramos a vida como uma coisa muito boa, apesar das desilusões que ela nos provoca, dos dissabores Mas é a vida que é cruel e não a morte.
Nascemos preparados para morrer, mas não isentos do sofrimento que a morte nos provoca, porque esse só pelo esclarecimento se combate. Desta forma se compreende que a morte que nos espera é um acontecimento de justiça total.
As religiões cristãs conferem à morte um rosto triste, arrastando para a sobrevivência a ideia de corpo carnal. Com isso pensam que matam a morte. O Espiritismo, como cristianismo primitivo, faz precisamente o contrário, tenta dar vida à morte. Por outras palavras, há que preparar o Espírito, esclarecendo-o, para que seja prolongada o mais possível a sua permanência na morte (estado de desencarnado). Há que retardar o regresso. Há mesmo que preparar o seu não regresso. E isso é fácil de compreender, as Entidades mais esclarecidas não voltaram à Terra, e só à distância, muito à distância, comunicam com este planeta através da hierarquia espiritual.
O papel do Evangelho é mostrar que todos os que vêm a este planeta têm naturalmente que partir um dia. Mas o Evangelho não fica por aqui. Ele ensina-nos a esperar o certo, e diz-nos como morrer. Para tanto apela à vigilância, à prece e ao amor, ainda que sejam vivências muito íntimas do nosso coração espiritual.
O que nos espera, então? Espera-nos o dia em que veremos na morte a grande felicidade, o momento mais esperado e mais alto da vida. Será quando diremos com profunda alegria “Vou morrer!”, mais enfático ainda se dissermos “Vou definitivamente morrer, pois já encontrei o meu caminho. Tenho amor, tenho luz, tenho paz. Tenho tudo. Sou feliz, inteiramente feliz!”
Desde sempre que a morte é vista como uma ocorrência do futuro, certa mas longínqua. Provavelmente uma vingança dos deuses, ficção de Deus, uma herança mórbida de Adão e Eva, um jogo macabro, uma fatalidade, um destino nada honroso. Um acontecimento sempre para depois, para nunca mais, eternamente adiado. No entanto, há em nós uma qualquer sensação que não conseguimos definir que nos leva a pensar que a vida é-nos emprestada; ela acontece como se algo nos trespassasse num ápice, um mero punhado de anos, e nos engolisse de novo para se saciar e cantar vitória.
Por isso dizemos que viver é um desafio, jogo perigoso entre o aqui que vemos de forma distorcida, e o para lá de que não nos lembramos. A vida é uma herança dolorosa, uma construção sólida de um futuro ao qual não escapamos.
No entanto, a morte talvez seja o único acontecimento que merece ser referenciado como “o futuro”, porém nada distante Ela persegue-nos, conhecedora da nossa temeridade, das nossas lutas, das certezas próprias dos incoerentes.
Este paralelismo insólito é responsável pela certeza cruel de que não há nada que nos faça escapar, sobreviver, perpetuar. Vamos definitivamente morrer. Uma desgraça, é verdade.
Mas há quem pense que não. Ou então há quem acredite que a sua hora não chegará enquanto não tiver feito tudo o que acha que tem para fazer. Só que de repente lá se vai o castelo, e Deus é tão injusto. Mata as criancinhas, os jovens, os pais de família, as mães com filhos que ainda mal chegaram ao mundo, gente importante com grandes projectos para a Humanidade... A morte, quando vem, não escolhe. Porquê? Podia levar os que não fazem cá falta nenhuma, os maus, os ambiciosos, os assassinos. Esses são os que ficam sempre para mais tarde.
A morte é assim mesmo. Que sabe ela a nosso respeito, das nossas intimidades mais recônditas? Que percebe dos nossos projectos, que noção tem de Humanidade?
Segundo o Espiritismo, de nada nos serve esta conversa. Nada do que acabamos de dizer faz sentido, pois a revolta, os queixumes ou as desilusões não são bons conselheiros. Só se desilude quem se ilude, e a ilusão é própria da crendice. A vida é objectiva, e a morte ainda mais. Morrer é sobreviver, com regras, com leis muito precisas.
Ninguém escapa a essa realidade porque todos estamos no mundo apenas de passagem, passagem essa cheia de labutas mas que, após o seu cumprimento, somos “puxados” para o mundo a que realmente pertencemos. E isso não é uma questão de mérito, apenas, mas de presente mais passado. Quem reencarnar para uma vida de trinta anos não vive oitenta, mas quem reencarna para oitenta pode reduzir para trinta, e mais facilmente do que pensa.
Essa redução do tempo de permanência na Terra não tem nada a ver com o sofrimento, mas com o modo como este é encarado e vivido. O bem ou mal sofrer definem não só o modo como se vive o tempo que é destinado a uma encarnação, como também o impacto ou força que lhe conferimos face à existência em sentido lato.
Assim, quem tem fé sabe que o desencarne em pessoas ainda jovens significa que terminou um ciclo, que a pessoa não iria beneficiar se permanecesse mais tempo na Terra, que certamente a existência foi encurtada por vias duvidosas, nomeadamente através do consumo de drogas, ou por uma forma de estar socialmente desconexa. Isto significa que a morte, nestes casos, é um benefício acrescido, pois o Espírito é retirado do meio terreno com o propósito de ser tratado no Astral; que lhe foi dada a oportunidade de reencarnar em um meio no qual provou que ainda não estava convenientemente preparado; que a sua presença era de tal modo nociva que, porque fora do âmbito do karma colectivo daqueles com quem convivia mais de perto, não conseguiu subir ao nível, ainda que muito baixo, dos seus semelhantes.
Além disso, e porque é referenciado em O Evangelho segundo o Espiritismo, (KARDEC, A, 1987, p. 93) se entre duas pessoas, uma boa e uma má, desencarnar a primeira e não a segunda, queremos esclarecer que isso é o mais comum e, portanto, nada tem de anormal. Ao bom não é necessário mais tempo de vida porque já evoluiu, ao mau a permanência por mais algum tempo ser-lhe-á benéfica pois ainda tem muito para modificar.
Outro aspecto insere-se no facto de muitos considerarem a morte como uma fatalidade. Ora, a morte não é uma fatalidade. Aquele que vai nadar num rio, depois de ter sido avisado de que este é perigoso porque tem fundões e remoinhos, e morre vítima de um acidente dessa natureza, com apenas vinte anos de idade, não podemos dizer que essa morte foi uma fatalidade. Apenas que não respeitou ou não cumpriu a informação que lhe foi dada. Além disso, mesmo que a morte não ocorra por acidente, mas de forma súbita ou doença incurável, morrer jovem é tão justo como morrer velho, e não há qualquer fatalidade. Segundo a referida obra (pp. 91-92), a morte não é capricho, crueldade, miséria ou perdição. Prolongar uma vida estagnada na evolução, sem objectivos e sem amor é que poderia ser tudo isso, e muito mais. Não tenhamos dúvidas, seria muito mais perigoso para a pessoa viver uma vida inútil.
Quantas não são as mortes que bendizemos e agradecemos a Deus? Quantas não abençoamos afirmando que são uma graça da Divindade, pois aquela vida estava a ser muito sofredora? Querer prolongá-la seria egoísmo, incoerência, falta de amor. Quando tal acontece por doença súbita obedece à mesma justiça e é obra do mesmo Ser. Somos nós que ainda encaramos a vida como uma coisa muito boa, apesar das desilusões que ela nos provoca, dos dissabores Mas é a vida que é cruel e não a morte.
Nascemos preparados para morrer, mas não isentos do sofrimento que a morte nos provoca, porque esse só pelo esclarecimento se combate. Desta forma se compreende que a morte que nos espera é um acontecimento de justiça total.
As religiões cristãs conferem à morte um rosto triste, arrastando para a sobrevivência a ideia de corpo carnal. Com isso pensam que matam a morte. O Espiritismo, como cristianismo primitivo, faz precisamente o contrário, tenta dar vida à morte. Por outras palavras, há que preparar o Espírito, esclarecendo-o, para que seja prolongada o mais possível a sua permanência na morte (estado de desencarnado). Há que retardar o regresso. Há mesmo que preparar o seu não regresso. E isso é fácil de compreender, as Entidades mais esclarecidas não voltaram à Terra, e só à distância, muito à distância, comunicam com este planeta através da hierarquia espiritual.
O papel do Evangelho é mostrar que todos os que vêm a este planeta têm naturalmente que partir um dia. Mas o Evangelho não fica por aqui. Ele ensina-nos a esperar o certo, e diz-nos como morrer. Para tanto apela à vigilância, à prece e ao amor, ainda que sejam vivências muito íntimas do nosso coração espiritual.
O que nos espera, então? Espera-nos o dia em que veremos na morte a grande felicidade, o momento mais esperado e mais alto da vida. Será quando diremos com profunda alegria “Vou morrer!”, mais enfático ainda se dissermos “Vou definitivamente morrer, pois já encontrei o meu caminho. Tenho amor, tenho luz, tenho paz. Tenho tudo. Sou feliz, inteiramente feliz!”
Barbara Diller